Ganhos com essa interação com o veículo são inúmeros, mas isso tem seu custo social: como fica a privacidade?
Para um carro, tanto faz se o motorista está triste, chateado, nervoso ou feliz. Você está no controle e, a rigor, dirige como quiser. Mas essa indiferença está para mudar. Nos próximos anos, os veículos terão condições de reconhecer o rosto do dono e até de entender que sentimento prevalece em suas decisões.
A vantagem é impedir que pessoas emocionalmente abaladas ou cujos reflexos estejam comprometidos assumam o volante. É até possível bloquear funções do automóvel caso o computador perceba que o condutor está embriagado ou com muito sono.
A DTS, empresa norte-americana de som para cinema e vídeo, lançou um sistema desses para uso automotivo. Trata-se de uma câmera acoplada a uma central que detecta a quantidade de ocupantes, identifica o motorista e monitora seu nível de atenção — ela sabe quando o olhar é desviado da pista e pode dizer se a pessoa está apta a dirigir.
Eu testei essa inovação durante a CES, a maior feira de tecnologia do mundo, promovida todos os anos em Las Vegas. Quando eu olhava para baixo, como se estivesse conferindo o celular, uma frase aparecia na tela: “Mantenha os seus olhos na estrada”. Ao abrir um sorriso, a barra do gráfico disparava e mostrava o quão feliz eu aparentava estar. A mesma lógica ocorria quando eu fazia cara de triste, de surpresa, de brava, de nojo ou de assustada.
O sistema faz o mapeamento dos pontos do rosto e consegue entender o volume dos ossos e a distância entre os olhos, por exemplo — é o mesmo princípio de reconhecimento facial usado para destravar a tela de celulares.
Os ganhos com essa interação com o veículo são inúmeros, mas isso tem seu custo social: como ficam as questões de privacidade? O que as empresas passam a controlar? Como o compartilhamento desses dados pode afetar a vida dos usuários? Será que as seguradoras podem ser avisadas de que aquele condutor tem o hábito de desviar a atenção da pista enquanto dirige?
No dia a dia, o rosto pode ser usado para abrir o carro e ligar o motor dispensando a chave. A DTS vai além: diz que cada motorista terá um perfil de configuração. Basta entrar no carro para que o painel de instrumentos, luzes e até as posições de bancos e retrovisores sejam ajustados de forma personalizada.
Chorar enquanto ouve uma música romântica dentro do carro sem ser notado? Nunca mais. A assistente pessoal poderá sugerir que você coloque uma música mais animada, se o carro detectar tristeza em seu rosto. Ou música new age, aquela usada para meditação, caso você aparente estar com raiva. Está passando mal? O carro será habilitado para chamar automaticamente a emergência.
Esses controles podem ser apenas uma sugestão. Ou podem ser compulsórios, dependendo de quem está ao volante — quando você empresta o carro para o filho recém-habilitado, por exemplo.
Mas e se alguém tentar hackear o sistema? Um rosto até 20% coberto ainda é detectado. O sistema é tão avançado que reconhece inclusive quem já fez plástica, não é enganado por maquiagens nem por novos cortes de cabelo. As imagens não são armazenadas na nuvem — lá ficam apenas os dados e números. Então, se um hacker quiser “roubar” sua foto, não conseguirá.
O sistema também não funciona com uma imagem, um vídeo ou uma máscara do proprietário do carro, por mais bizarra que essa cena pareça. Assim como no iPhone atual, a detecção só funciona quando o usuário está olhando para o dispositivo, ou seja, ele precisa estar acordado.
Não dá para negar: uma infinidade de coisas interessantes podem ser feitas com essa tecnologia. Basta saber se as montadoras saberão dosar o uso do sistema para que ele fique interessante e não “avance nenhum sinal”. Afinal, é para isso que ele serve.
Fonte: Revista Auto Esporte
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